História

A Liga Brasileira de Epilepsia nos seus 70 anos

Elza Márcia Targas Yacubian
Livre-Docente em Neurologia, Unidade de Pesquisa e Tratamento das Epilepsias, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo

Dedico este texto, com meus agradecimentos, ao Dr. Gildo Benício

 

A história da Liga Brasileira de Epilepsia pode ser dividida em dois períodos: o período fluminense e o período de migração nacional.

  1. A Fundação da Liga Brasileira contra a Epilepsia

A Liga Brasileira contra a Epilepsia (LBE) foi fundada no dia 15 de agosto de 1949, na sede do Centro de Estudos Paulo Cezar de Andrade, na Santa Casa de Misericórdia, no Rio de Janeiro. O fundador e primeiro presidente foi o Dr. Paulo Niemeyer Soares.          

Dr. Paulo Niemeyer Soares - Presidente
Presidente Fundador

Dr. Paulo Niemeyer Soares

Paulo Niemeyer Soares (1914-2004) palestrando sobre sua criação da técnica da amígdalohipocampectomia transventricular no XXI Congresso da Liga Brasileira de Epilepsia em São Paulo, no dia 27 de junho de 1996. 

Tratou a LBE de se filiar à ILAE, cujo Presidente em 1949 era o Dr. William Gordon Lennox.  Na época, além dos capítulos originais holandês, britânico e escandinavo que apoiavam a International League against Epilepsy (ILAE), havia apenas os da Argentina, França e EUA 1. O capítulo brasileiro foi reconhecido na sétima reunião da ILAE ocorrida no dia 8 de setembro de 1949, durante o Congresso Internacional de Neurologia na Faculdade de Medicina da Universidade de Paris. William G. Lennox foi substituído por MacDonald Critchley, seguido por Henri Gastaut, colaborador para a consolidação de capítulos locais da ILAE (incluindo o brasileiro) na América do Sul. Assim, o berço da LBE está nesta encruzilhada de encontros históricos de grandes nomes precursores da epileptologia mundial.

  1. A Liga Brasileira contra a Epilepsia: o período fluminense

O conhecimento acumulado, as escolas consolidadas, e o Brasil, sob a liderança do Dr. Paulo Niemeyer, acompanhou o fluxo do progresso que construiu solidamente a instituição médica até 1974, no Rio de Janeiro. Anos após sua fundação, foram instalados vários capítulos estaduais adicionais, primeiro em Salvador, Bahia, e passaram a ser realizadas reuniões semestrais, inicialmente concomitantes às da Academia Brasileira de Neurologia e, a seguir, a partir de 1990, de forma autônoma 2. Para patrono da entidade foi escolhido o grande Professor Antônio Austregésilo, primeiro catedrático de Neurologia no Brasil.

A LBE inicialmente era dividida em secções, a saber: secção de Neurologia, de Neurocirurgia, de Medicina Psicossomática, de Psiquiatria, Médico-Social e de Divulgação e Ensino. Havia um Conselho Consultivo, que incluía médicos e também leigos, como o General Mendes de Morais e o Sr. Assis Chateaubriand. Ao Secretário Geral, Dr. João Luiz Alves de Brito e Cunha, coube a tarefa de registrar os Estatutos. O tesoureiro foi o Dr. Og de Almeida e Silva. Na sessão de instalação estiveram presentes 16 pessoas, entre elas dois futuros Presidentes, os Drs. Fernando Pompeo e Abraham Akerman. O primeiro Membro Honorário da Liga foi o Prof. William Penfield, do Canadá 3

Preocupou-se logo a Liga em instalar um Ambulatório de Epilepsia, o qual passou a funcionar na Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. A seguir, ampliou o seu quadro social com a eleição de novos Membros Efetivos, Correspondentes Estaduais e Honorários Estrangeiros. A categoria de Sócio Honorário inicialmente era apenas para personalidades estrangeiras. Curiosamente foi feita uma exceção para um brasileiro que, embora formado em Medicina, não a exercia: o então Governador de São Paulo, Ademar Pereira de Barros (1901-1969). Entre os não brasileiros, vieram se juntar aos nomes de Wilder Penfield de Montreal, os consagrados Jasper e Erickson (Canadá), Gibbs, Lennox, Merritt, Earl Walker e Putnam (EUA), Olivecrona (Suécia), Egas Moniz (Portugal) e Asenjo (Chile) 3.

Internamente, foram criadas duas comissões, uma destinada a estudar uma padronização do exame das pessoas com epilepsia, outra para os problemas do indivíduo com epilepsia face a legislação vigente. As reuniões da Liga eram mensais, e toda a atuação da entidade era concentrada no Rio de Janeiro 3.

Em 11 de agosto de 1952, houve renovação da Mesa Diretora, ficando a Liga com os seguintes dirigentes: Presidente: José Leme Lopes; Secretário Geral: Dr. Benedito Mettre e Tesoureiro: Dr. Silva Neves.

Em 23 de julho de 1953 procedeu-se nova eleição, voltando o Dr. Paulo Niemeyer à Presidência, tendo como Secretário Geral o Dr. Adahyr Costacurta e o Dr. Leo Cabral de Medeiros como Tesoureiro. Foi feita então uma reforma dos Estatutos, sendo criada a categoria de Sócio Contribuinte, destinada àqueles que quisessem cooperar apenas financeiramente, e o mandato da Diretoria foi fixado para um período de quatro anos. Este Estatuto era bem mais completo que o primeiro. Nessa gestão, a Liga foi registrada civilmente passando a ter existência jurídica e o Dr. Paulo Niemeyer foi eleito Vice-Presidente do Comitê Executivo da ILAE do qual fizeram parte como Presidente, o Dr. A. Earl Walker (EUA) e o Presidente Eleito, Dr. Henri Gastaut (França). Por essa época as reuniões da LBE não eram apenas administrativas e nelas eram apresentados casos clínicos e/ou palestras 3.

Em 1954 veio ao Brasil, a convite da LBE, o célebre Professor Henri Gastaut, que ministrou um Curso intitulado “Estudo eletro-clínico das epilepsias”.

Por outro lado, a Liga recebia contribuições de pessoas não médicas, algumas delas vultosas, e aparelhava o Ambulatório de Epilepsia, também ajudando na instalação do Serviço de Neurocirurgia, na Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. Também foram feitas doações pela Prefeitura do então Distrito Federal, tendo as mesmas aplicações. Diversos cursos foram ministrados por professores estrangeiros, tendo a Liga trazido ao Brasil nomes como o já citado Henri Gastaut, e mais Earl Walker (EUA), Bartolomeu Fustes (Uruguai), MacDonald Critchley (Inglaterra) e Guy Lazorthes (França). Foi então instalado o primeiro ramo estadual da LBE, que veio a ser o Capítulo Baiano, presidido pelo psiquiatra Álvaro Rubim de Pinho 3. Em 1957 o Dr. Paulo Niemeyer foi reeleito Presidente, desta feita tendo como companheiros de Diretoria os Drs. Djalma Chastinet (Secretário Geral) e Frank Thum (Tesoureiro), para um novo mandato de quatro anos. Passou então da Liga por um período de certa apatia, o que ficou evidenciado no final do mandato por falta de quorum e de candidatos em duas convocações, não houve eleições em 1961, sendo o mandato da Diretoria vigente automaticamente prorrogado até 1964, quando os destinos da LBE foram entregues aos Drs. Abraham Akerman (Presidente), Tobias Bitter (Secretário Geral) e Hélio Belo (Tesoureiro) 3.

A entidade passou então por uma fase na qual, embora se fizesse representar regularmente nas reuniões da ILAE e tivesse intercâmbio com a Liga Argentina, teve uma atuação discreta no plano brasileiro.

Só em 1971 ocorreram novas eleições, sendo reconduzido o Dr. Akerman, tendo como Secretário Geral o Dr. Elias Engelhardt e Tesoureiro o Dr. M. Casrilevitz.

Este segundo mandato do Dr. Akerman foi dedicado à expansão da Liga no Brasil. Assim é que surgiram os Capítulos de Alagoas (em 08 de maio de 1971) tendo como Presidente o Professor Gilberto Macedo; Pernambuco (11 de maio de 1971), sendo o primeiro Presidente o Professor Manoel Caetano de Barros e o de São Paulo (20 de maio de1971), tendo como Presidente o Dr. Luiz Marques de Assis. Surgiram também os capítulos de Sergipe (em maio de 1971), sob a Presidência do Professor Tarcísio Leão e do Estado do Rio (maio de 1971), Presidente Dr. Glieb Ávila Pereira 3.

 

Primiero Período
Comitê Executivo da ILAE: 1953 - 1957
  1. Liga Brasileira de Epilepsia: período de migração nacional

Seguiu-se a ampliação do quadro social. Para esta finalidade, contou a Liga com a colaboração do Professor Jorge Armbrust de Figueiredo de Ribeirão Preto, que teve atuação destacada na aquisição de novos membros conseguindo um significativo número de adesões. Em vista deste crescimento do quadro social tornou-se imperativa uma reforma estatutária, a qual veio a se processar durante o mandato da próxima Diretoria eleita em 13 de julho de 1972 e composta pelo Professor Fernando Pompeu (Presidente), Dr. Almir Guimarães (Secretário Geral) e Maier Sztajnberg (Tesoureiro). No novo Estatuto, o mandato da Diretoria passou a ser de dois anos, e foram extintas nas antigas secções de Neurologia, Psiquiatria, entre outras, passando a LBE a ter como dirigentes os membros da Diretoria Executiva e os Presidentes dos Capítulos, que tiveram a designação de Vice-Presidentes da Liga. Uma importante modificação foi introduzida: a LBE passava a admitir sócios não médicos, aos quais era exigido “nível universitário e interesse pelos problemas das epilepsias” 3.

Passou então a Liga por um trabalho de estruturação administrativa, a essa altura fundamental, face ao crescimento do número de sócios. Surgiram os Capítulos de Brasília (em 08 de março de 1974), sendo Vice-Presidente o dr. Fernando Guilhon Henriques, de Goiás (em 09 de março de 1974), ficando à frente o Dr. Abdo Badin e do Ceará. Prosseguindo o crescimento do quadro social, a Liga adotou sua primeira atitude reivindicatória, conseguindo o retorno ao mercado do fármaco etosuximida, representada pelo produto “Zarontin”, que havia saído de linha. A LBE participou do VI Congresso Brasileiro de Neurologia, organizando uma Mesa Redonda, acerca de temas de Epileptologia 3.

A 13 de abril de 1974, foi processada nova eleição para renovação da Diretoria da LBE, que passou a ser constituída pelo Presidente Professor Jorge Armbrust de Figueiredo; Secretário Geral, Dr. Michel Pierre Lison e Tesoureiro, Dr. José Geraldo Speciali, de Ribeirão Preto. Passou a Liga a fazer um trabalho de divulgação, promovendo palestras a nível regional, em São Paulo, atingindo a rede de ensino promovendo palestras em associações de Pais e Mestres. E iniciou a difusão de conhecimentos atualizados para os médicos, elaborando e distribuindo livretos contendo as aquisições modernas nos campos de diagnóstico e tratamento. Administrativamente procurou a LBE aperfeiçoar a sua estrutura, e no campo reivindicatório empreendeu gestões no sentido de evitar a saída do mercado da solução intravenosa da difenilhidantoína, representada pelo produto Hidantal. Em 1976, em Salvador, a diretoria foi reconduzida 3.

Seguiu-se a direção composta pelos drs. Gildo Benício (Presidente), Gilson Edmar Gonçalves (Secretário Geral) e Ana Maria van der Linden (Tesoureira), eleita em 29 de setembro de 1978. Em sua gestão, além de profícuo trabalho em fortalecer a entidade, foram criados o Boletim e o Jornal da Liga Brasileira contra a Epilepsia, em um dos números do qual, figuram a maioria dos dados aqui referidos 3. Consta em uma Ata da Assembleia Geral Ordinária realizada em 15 de outubro de 1980 esta Diretoria mudou a razão social alterando a denominação Liga Brasileira contra a Epilepsia para Liga Brasileira de Epilepsia 3.

 

2.1 Liga Brasileira de Epilepsia- Os registros legais

A Ata da Fundação de 15 de agosto de 1949 foi registrada no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas- Cartório Castro de Menezes- sob número 3.262 em sessão de 18 de junho de 1954, juntamente com seus Estatutos.

O outro registro foi a Ata da Reunião de 05 de abril de 1972 realizado em 15 de maio de 1973- protocolo 103.777/L-A17 da Diretoria presidida pelo Dr. Paulo Niemeyer, tendo como Secretário Adair Costacurta e Tesoureiro Leo Cabral de Menezes. Com a finalidade principal de registrar a compra de sua Sede Permanente na cidade de São Paulo, cita a Rua Teodoro Sampaio, número 741, conjunto 94, CEP 05405-050, no bairro de Pinheiros, em São Paulo, onde permanecerão seus arquivos e documentos oficiais, o Presidente de então, Dr. Paulo Niemeyer, autorizou, outorgando poderes totais por escrito a Dra. Elza Márcia Targas Yacubian, a efetuar uma Assembleia Geral no dia 01 de julho de 1994 na cidade de Campinas, São Paulo (Registro Civil de Pessoas Jurídicas Sérgio P. de Moura no Rio de Janeiro). Nesta ocasião tomou posse a Diretoria constituída por Elza Márcia Targas Yacubian (Presidente); André Luis Fernandes Palmini (Secretário) e Luiz Athaíde Júnior (Tesoureiro), cuja Ata foi registrada no 7º. Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas- Dr. João Antonio Michaluat- em São Paulo, no dia 08 de junho de 1995. Desde então as Atas das Assembleias Gerais da eleição das Diretoria vêm sendo regularmente registradas nesta cidade.

 

2.2 Liga Brasileira de Epilepsia- As décadas atuais- a Nacionalização até os dias atuais

Desde a década de 1970, as diretorias democráticas e descentralizadas da LBE são eleitas em Assembleia Geral e migram entre os estados de diferentes regiões brasileiras. Consolidada em sua sede na cidade de São Paulo, a Liga - e sua congênere, a Associação Brasileira de Epilepsia, fundada em 1987 - formada por leigos e profissionais interessados nos aspectos médicos e não médicos da epilepsia, realiza um trabalho educativo contínuo voltado para os direitos das pessoas com epilepsia, inclusive em âmbito governamental.

Segundo Período
Segundo Período
Liga Brasileira de Epilepsia: 1974- Presente

Referências

  1. International League. Epilepsia 1949;4A:6-7.
  2. Gomes MM, Guerreiro MM. Liga Brasileira de Epilepsia no final do século XX: 50 anos de história. Braz J Epilepsy Clin Neurophysiol 1999;5:134-145.
  3. Benício G. Um pouco da história da Liga Brasileira contra a Epilepsia. Jornal da Liga Brasileira contra a Epilepsia. Órgão Oficial de divulgação da LBE, biênio 79/80.

 

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